Desintegrar
A casa era branca, os bancos no mesmo lugar,
a rede na varanda esperando com a chuva avoar,
a calçada das tardes cheias, mulheres em todo lugar,
o comprador, o vendedor, a noite querendo chegar,
a rima no papel riscado,
desde sempre, amassado, querendo um dia andar,
sair desse clima, dessa pequena monotonia
que teima em viver neles
andando, saindo, partindo,
agora já mar.
as caixinhas de fósforos ascendendo os fogões,
o relógio a reclamar a hora do cheiro inesquecível
eu inventava as falas das moças,
as meninas a esperar.
Eu viajava pelo mundo com rios brutos,
sempre entre as paredes de minha terra.
meu biscoito desejado oferecido ao amiguinho,
que não existia.
que nunca existiu.
eles, tem toda a dor do mundo,
eu, só tenho a minha.
as velhas sentadas nas portas,
observam mais que o dia morrer.
Contam, dia a dia, suas insignificâncias,
seus maridos sem amor,
seus filhos que repetem a contagem dos dias,
um a um, encontrando seu par.
a escola sem lição, reproduzindo o padrão dessa terra infértil,
dessas tardes alaranjadas, jorradas sem ritmo.
esses irmãos, que não são meus,
e no possuem a genética do belo.
os cabelos sempre secos,
as vestes, sempre limpas.
Eu penso e logo deixo de existir,
nesses dias inventados por lembranças guardadas atrás dos olhos
por roupas nas gavetas de um bebe que não foi eu,
por uma criança que pede para sugar seu seio,
sendo, também, uma criança,
sendo uma rede avoada que teima em subir,
mas esta presa em um armador enferrujado.