MIRTES E A ORDEM DO VENTRE
A senhora dos Abutres
 
O barco do Terminador
Regava sonhos
Alucinantes
O suor pingava
Do rosto
De encontro
Ao claro-piscante da noite
Os mastros cobertos
Por velhas bandeiras
Falidas
Deixadas pelos desafios
Que emergem falando
Um convés vazio
Um frio molhado
Temperado
Nas águas dos mares
Que mares eram
Todo caminho
Em volta da solidão
Que sentia
O homem solitário
Sem rosto
apenas um relicário
Acendia
Segurado a frente
Iluminava o pouco
Do nada que se via
Horizontes escuros
Ondas derrubavam
Qualquer signo
Que ela se dobrava
P’a entender
havia um cheiro
de morte
que a chuva descrevia
o hermita-fantasma
nada devolvia
do sentimento adverso
talhado na madeira velha
corroída
um verso das tumbas
que Seth inflamava
em seus ouvidos
tendo os sentidos
todos roubados
no momento fatídico
eram os ditos do Descido
que ela tinha amado
vindo falar
a seus anseios
As luas transcendem
vossa vontade
os terrenos
amam toda idade
eu vingo no teu cálice
minha eternidade
não amo a voz que cala
o mortal deste tempo
se despede de ti
imortal dos ventos
que adormece estrelas

era o feroz convite
num tempero
orgástico
o som dos metais
das argolas e correntes
a frequente abertura
das cancelas
as janelas onde dormia
chamavam Dévora
de volta dos sonhos
troncos liqueados
num tempo longinquo
nadavam por perto
a esteira que a proa
apontava
estava perto de fincar
na areia
ela via os prometidos
lutando contra
as sereias
seu rosto na moldura
pintada
que ela fantasia
sofre a agonia do ventre
pede a fome
do desejo arrependido
quis pular se afundar
usar a forca do mártirio
chegar a um porto
morta de destino
desfalece a guerra
pela superfície
o ocular escuro
brilha
cega o outro dormido
adentra o rosto
escondido do hermita
descobre um cadáver
iluminado
guiando-a sozinha
um grito sinistro
faz desaparecer
deixando a toga no chão
seu coração nada sente
percebe quem está
presente
pressente o ar úmido
crescer por dentro
a prata anelada
nos pés lhe assalta
num brilho de sol
transporta o corpo
do morto-vigia
pelo alçapão que se abre
desaba nuvens
como mãos de arqueiro
lhe acertam raios
soltam dormentes
como facas
a prendem no mastro
as amarras se soltam
viram cobras aladas
em volta da cintura
olham-na malditas
por dizer do despojo
que ela pertencia
querem a acolhida
bravura que tinha
quando matou
o encanto do protegido
dobra a espinha
na força do algoz mortal
quer ver apenas seu sangue
neste barco vertido
o anel derretido
no fogo
que enfrentou o destino
quis ser a herança
das aventureiras
a astuta ninfa das arteiras
as zombas entre
o céu e o inferno
se debruça no golpe
que fervia
um liquido amargo
antes que ela subisse
de sua ilha
ela talvez adivinhasse
que seu suco
no andarilho-semeador
não teria sido aceito
ele agora quer a partida
eterna
da mulher que permitiu
ter luz na caverna
d’aquelas que são
apenas a fome vencida
de Deuses
descobre um vale a frente
o barco se abre
soltam as correntes
do seu corpo
o uivo de um lobo
prenuncia
quem lhe oferece acolhida
Démon abre as portas
Do castelo da colina
O altar onde foi
A princesa do crime
É agora o lar dos abutres
E as filhas do acaso
A ruiva destemida
Sentada num trono
De esmaraldas
Destinava Dévora
A sentar a seu lado
O alado monstro-serpente
Havia roubado
Sua sina.