CIDADE
Patogenicidade
Um zum-zum perturba meu sono
Aliado a buzinas e estrondos
Longínquas batidas perfuram meus ouvidos
Interferências, ruídos, zumbidos.
Milhões de fios se tecem
Em varas de pedra
Milhares de luzes resplandecem
Numa cascata de LEDs em queda.
O luar não ilumina mais
As avenidas fosforescentes
As praças incandescentes
E os viadutos de luz carentes.
Esgotos em canais
Desgostos banais
Estresse em alta
E amor em falta.
Passarinhos ainda tentam sobreviver
Competindo com as aves de metal no céu
E, mesmo num mundo tendido a aquecer
As abelhas ainda lutam para produzir seu mel.
As nuvens são pesadas de tantas informações
As paredes carregadas de grafite
Os homens nublados de aflições
E as gotas de chuva caem bit por bit.
Milhões de olhos se fixam nas televisões
Uma mixagem de sons, filmes, imagens
A vida passa rapidamente em sessões
Como rolos de filmagens.
Atomicidade
Somos meros átomos
Neste organismo cinzento
Infectado e virulento, violento
Arrastando-se em bipolaridade
Sábados agitados, domingos sonolentos.
Ondas de rádio perpassam nosso corpo
Surfamos todos numa rede global de teias
Telas refletem em nosso olho
Fluxos de dados percorrem nossas veias.
Metrópoles de pensamentos
Ideias umas atrás das outras, engarrafamentos
Semáforos de ilusões
Torrentes de ligações
Alô!? Quem!? Diga!
Pare... Atenção... Siga!
É tic-tac, tic-tac
Bam bam, plec plac
Vrum vrum vrum
Tum tum tum.
Velocidade
Não há mais tempo para ter tempo
É um corre-corre cotidiano
E quando se vê já é fim de ano
Mundo invertido, trabalho passatempo
Povo inadvertido, lazer contratempo.
O passado rural já é lenda
Moradores de rua em tendas
A cidade grande já engoliu a esperança
Das pequenas vizinhanças.
Toxicidade
Em polvorosa
Gangues, usuários de drogas
Tiroteios, perseguições e rodeios
Tráficos, tráfegos, trôpegos
Perdas dolorosas, vítimas do meio.
Furacidade
Os cães latem e ladram
E os ladrões roubam e matam
E levam um colar de liberdade
Ou um relógio de felicidade.
Mendicidade
Afoga os cidadãos
A obesidade infla os glutões
Falta pão para as bocas dos peões
A sociedade estende as mãos
Mas só ouve negações
Pede esmola, escuta um não
É só a inflação...