CAMPEÃO
a saudade permanece intensamente
presente de um tempo em que
nunca existiu, nunca houve
na lembrança real do que foi...
só conheci campeões -
na vida e no sonho -
porque nunca houve fracasso,
houve erros, houve derrotas...
sempre a felicidade -
claro que velada por algumas tormentas -
porque quem não as têm
nessa torpe mentira de vida?
saudade de gente humana
que tivesse confessado um
erro, um deslize
e também uma desilusão...
alguém que me dissesse
que não pode viver isso ou aquilo,
que desejou mas não teve,
que foi obrigado a usar dominós...
não! isso nunca!
alguém que me narrasse
que nas noites frias
sentiu escorrer uma lágrima quente...
alguém que tenha morrido de sede
em frente ao mar e morrido
de fome em frente ao banquete...
não! de forma alguma!
são todos campeões,
perfeitos e felizes
naquilo que se propõem...
sem barreiras e obstáculos...
se erraram, são porque são humanos...
podem errar sem errar...
nenhum deslize a ser cobrado,
nenhuma falha a ser apontada...
vil sou eu... sem tirar nem por...
eu! que não sou nem fui,
que estou no meio do caminho
entre o desejo e o que fizeram de mim...
não há respostas que me saciem
já que não encontro o enigma
de um falso herói da existência
que luta na resistência...
um aviso, uma luz
no fim do túnel...
ouço vozes...
vejo o brilho...
é o eco do coração
que procura sobreviver
em meio ao caos
em que permanece...
é o tédio de não ser,
é a solidão de não ter,
é a monotonia de não poder,
é a vontade de viver...
herói do vazio e do nada
onde, fraca e persistente,
permanece a esperança
de um dia existir...