Aos poucos

Aos poucos tomo o trágico por fantástico.

Vejo-o crescer e enraizar-se qual ente mágico

Que quer do futuro se adonar como único juízo

Do qual nos valeremos amanhã.

Aos poucos sangra o sonho em hemorragia

Que vaza aos poros e se vira em aguda abulia

Fazendo do ontem um não-sei-que de morte e banzo

Que se mostra em espasmos de terçã.

Aos poucos a força bruta dilacera

A opção concreta e aquela que se espera.

Transforma a busca de antes em mero zanzo

Vira certezas em caminhos sem afã.

Aos poucos anoitece o parco dia

Com o temor do que se aponta e se anuncia.

Tremores se instalam na face que franzo

Enquanto aguardo ao menos outra manhã.