CANTO 106

Amador Filho.

Que domingo triste!

Há algo no ar de pesado, de fúnebre, de sufocante...

Esta ideia subjetiva de esquecido, de abandonado, de desprezado, de jogado fora, embora seja iníqua, perversa, ferina, fere, ultraja, vilipendia o mais profundo, abissal, abismal do meu ser...

Como pode um ser humano, uma criatura, um ente vivo racional, inteligente, lúcido, ser descartado, posto de lado, omitido, pelos próprios familiares? Pelos filhos? Pela esposa? Os familiares são distantes, interesseiros, calculistas... Os filhos são indiferentes, esquecidos, ingratos... A esposa, fria, cruel, pérfida...

Este esposório com a tristeza, com a desesperança, com a solidão, vai, pouco a pouco, devagar, paulatinamente consumindo, subtraindo, aniquilando minha existência, minha vida, minha encarnação...

É como se algo, alguma coisa, um motivo, estivesse de maneira lenta, vagarosa, sutil a desestruturar, aniquilar, absorver o desejo o anseio, a sede de ser considerado, compreendido, amado...

Tenho o psiquismo, o coração, o ser, onusto, carregado, cheio de anseios, de esperanças, de desejos que vão se diluindo, se desgarçando, se volatilizando, à medida, ao modo, à maneira que a dor, o sofrimento, a angustia se instalam, permanecem, se eternizam nos meus sonhos, meus ideais, meus objetivos...

E vou levando a vida abalado, combalido, deprimido, sentindo-me um maldito, um réprobo, um excomungado...

A vida tem-me reservado, destinado, oferecido, ultimamente, agora, por estes dias, a porção, a quantidade, o bocado mais azedo, mais amargo, mais ácido...

E este estigma, este ferrete, esta cicatriz, de dores, de sofrimentos, de desilusões, não cessa, não acaba, não termina, nunca, jamais, em tempo algum...

É presente, é constante, é infinito...

Sou um homem vencido, um derrotado, um aniquilado...

Somente em Ti Senhor, meu Deus, meu Pai e Pai de todas as cosisas, repousa, descansa, dessedenta-se meu psiquismo, minha verdadeira identidade, meu Eu...

“Senhor, Bendito sejas, sobretudo pela irmã dor, porque ela me aproxima de Ti. Prostro-me diante de Tua imensa obra, ainda que a minha parte, nela, seja o cansaço. Nada posso pedir-Te, porque tudo já é justo e perfeito na Tua Criação, mesmo o meu sofrer, mesmo a minha imperfeição que é passageira. Aguardo no posto do meu dever o meu amadurecimento, e na Tua contemplação busco repouso”. (Pietro Ubaldi)

Santa Luz, 16 de janeiro de 2000.

Sertanejoretado
Enviado por Sertanejoretado em 30/09/2014
Código do texto: T4982583
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