NÃO ME DIGAM

Não! Não me digam nada! Não quero saber e não quero entender nenhuma

sabedoria e nenhuma verdade que eu possa dizer que é verdade e verdade

absoluta... O que acredito hoje pode ser que não acredite amanhã,

porque ninguém atravessa o mesmo rio duas vezes e os momentos são

múltiplos e infinitos e as emoções diversas... A minha realidade é

diferente da realidade real composta e estratificada pelo social... A

minha realidade e, portanto, a minha verdade, é feita da emoção de

cada dia ao acordar e olhar a vida, os seres humanos que, por mais

podres que sejam, me fascinam e me seduzem... Vale a pena acordar

todas as manhãs só para viver um momento, para sentir o calor e a

brisa e o orvalho e o olhar de outro humano a procura da emoção de um

instante... Hoje, agora, neste instante de magia atormentada e fatal

que remove a montanha da ilusão num vendaval soberano do sentir... O

sol que brilha na eternidade de ser que se é, mesmo que seja pouco,

mesmo que seja efêmero, mesmo que seja finito... Não existe verdade

nenhuma absoluta que não possa ser removida e destruída... As verdades

são como castelos de areia... A vida é que vai ensinar, a vida é que

vai destruir, a vida é que vai construir... O que desejo, o que sinto

só vale para hoje... Porque os sentimentos humanos se modificam todos

os dias, todas as horas, todos os minutos e todos os segundos... É uma

metamorfose constante e perversa que nos faz atingir o vazio do Eu na

infinitude e complexidade do que somos... E é neste vazio que se

encontra a eternidade na absurdidade de termos consciência de que não

somos nada e tudo acaba... E a carne pede e a carne grita e a carne

estraçalha... Um desejo constante se apossa e se apodera de nós numa

alucinação mais poderosa que a nossa alma... Um olhar... Um gesto...

Uma carícia... fecho meus olhos e vejo... Vejo mais se os tivesse

abertos... Vejo mais além do que o próprio além de mim msma e mais

além do que a própria realidade... fecho meus olhos e vejo... vejo a

vida... vejo o sonho... vejo a luz... vejo o brilho... Uma carícia me

arrepia... O vento da tarde faz amor comigo... Os raios do sol me

penetram num ritual orgíaco da sedução... Um corpo... fecho os olhos e

sinto... Se aproxima do meu... Dou-te minhas mãos... um abraço... o

suor escorre do corpo... se mistura ao desejo da pele que se

entrega... uma boca... uma língua... a saliva... um beijo que percorre

os labirintos da carne... os poros abertos que se molham na umidade do

beijo salivar... o beijo da loucura mais louca que a própria

insanidade... Um beijo do desejo... tão esperado... tão ansiado... tão

meu quanto seu... neste momento de aproximação, neste instante de

magia apenas a miragem do que é se torna real e verdadeira... não há

verdades, não há morais, não há nenhuma realidade social... Nada,

absolutamente nada neste nada do que somos revestidos... As máscaras

se evaporam e são jogadas na latrina da vida... Comungo teu corpo

nesta missa do prazer onde o vinho é o suor e a hóstia a prórpia

carne... Deus é o amor no corpo nefasto e nefando dos mortais humanos

que vivem e que sentem a carne fremir... Não! Não me digam nada! Não

quero saber de verdades e não quero saber de palavras! nenhuma

palavra, por mais infinita que seja, alcança a glória deste momento...

não há verdade que destrua a ilusão... não há verdade que desmonte a

sedução de um momento mais eterno que a própria morte... não há

palavra que defina a Paixão... essa maneira de ser tão especial e

descontrolada loucamente linda do sentir o sentimento que, por menor

que seja, vale mais que a própria vida... Não! Realmente não quero

saber o que vocês têm a me dizer! Não quero que destruam a minha

vontade de acreditar nos sonhos e nos sentimentos e no ser humano...

Por mais que me dôa, por amis que me corte, por mais que me machuque,

por amis que me sangre, por amis que me estraçalhe, vale a pena viver

só para sentir o humano que existe em cada um de nós... sentir o

brilho de um olhar e o reconhecimento cúmplice de um sorriso, cheio

das intenções e cheio das cumplicidades... nada de palavras... o

silêncio grita mais que o próprio jorrar das palavras... só um olhar

já basta para se sentir todo o universo solar e estrelar dos sentidos

do sentimento... Não! Não me venham com verdades! Não creio nelas! Só

creio na emoção, não importa qual, que me faça chorar e sorrir na

glória de me sentir humana!

carline
Enviado por carline em 27/09/2014
Código do texto: T4978774
Classificação de conteúdo: seguro