PARTO
Eu hoje gerei a solidão
em forma de uma criança chamada tristeza...
Eu a pari com ternura
e ela me presenteou com a dor...
Carreguei-a nas entranhas
e sussurrei palavras singelas
que a fizesse adormecer
e acalentasse os seus sonhos...
E a criança quieta
foi crescendo e absorvendo
os tormentos da minha alma
e descosturando a teia da razão...
Pari na eternidade
a criança da dor
que escorre suas lágrimas
no batismo da redenção...
Ela cresceu nos pregos
entalados na garganta da cruz
e hoje reza aos céus
sua estadia nos infernos...
A criança gerada
na angústia da trilha
buscadora de si
e andarilha do outro...
Mendiga do perdão
amante da punição
concubina do coração
e prostituta da emoção...
A criança anda pelos labirintos
calcando suas entregas
pelos caminhos do calvário
que respiram seus espinhos...
E ela se infla de escárnio
e faz amor com a frieza
da aspereza da saudade
que a pisoteia nas tempestades...
Pobre criança faminta!
Sua busca não tem fim!
Gerada na pestilência do acalanto
e mergulhada na orgia da fragância...
Hoje encontra-se só
nomeio do vendaval...
Nascida da solidão
no parto da ternura...