O INQUIETO MORADOR DA NOITE
Disse bem Hugo Luna, na orelha deste livro, sobre Sindo: “um homem simples”.
Esta frase fotografa o homem-poeta, pois que os dois são um, dentro da possibilidade infinita de um e outro. Vê-lo e lê-lo nos da a certeza de vermos apenas um: um homem simples, sem rebuscamentos, ornamentos desnecessários ; um poeta simples como um menino, uma tarde de sol, um banho de riacho, na medida em que se desmembram em chuvas, “manhãs de sábado”, “feiras de Cochó”, “corpo de Maena”, (é a própria multiplicidade e simplicidade da vida); um homem-poeta simples, que fala de coisas simples, como os menestréis. O “simples” aqui não é o sinônimo de trivialidade, banalidade. Muito pelo contrário, esse simples conjuga-se perfeitamente com a noite. Nada mais simples do que a noite. E nada mais denso.
Nesse jogo noturno em que a simplicidade e a densidade da vida se delineiam, um olhar insone perscruta, de uma forma doce, o desespero de existir. Olhar o Sindo, dentro de si, dentro do mundo, na sua feliz convivência com a insônia e as palavras. É morando na noite, sim, sempre (quem o conhece sabe que isto não é metáfora, é a verdade do cotidiano dele), que o poeta Sindo Guimarães debruça-se sobre a vida. Mesmo quando, “tudo corre ao ritmo da tarde”, mesmo quando “uma mão invisível acorda o sol”, a noite é o seu estado maior de palavras e de silêncio. Por isso, ele sabe que nasceu “quieto como córrego triste!”. E é essa tristeza, indissoluvelmente noturna e exclamativa, que dirá da tristeza maior que existe na beleza, na simplicidade da vida. A tristeza indiferente a “foguetes estourando pelo céu”. A tristeza bela como a passagem da vida; e como seu desesperado e inquieto rodopio na noite, trazendo sempre de volta o menino de Olhos D’Àgua, que soube ouvir com profundidade as histórias contadas, do girau, pela Madrinha Ziza. Menino que entende mesmo, a fundo, com belo desespero, a simplicidade de uma determinada “cantiga do vento”
Assim, mesmo correndo o risco de estar resumindo o homem-poeta Sindo Guimarães, digo que este resulta, simplesmente (no peso leve que esta palavra traduz), de sua moradia: a noite casa de cômodos terrivelmente densos e belos.
(Ángela Vilma)
Feira de Santana, 05 de setembro de 2000