Das minhas noites inventadas...
Sou do tipo verbal: a palavra vem antes da ideia, vem depois da dor.
A palavra me dilui e me molda, mas se me definir com sua rigidez temporal, aperta meu calo. Talvez por isso eu saia descalça vez ou outra, pulando por entre as poças do silêncio e das lágrimas que não caem.
Que alagam por dentro.
Sou do tipo que vive bem na escuridão, onde os pensamentos flutuantes bailam sublimes e intocáveis, porque quando eles vibram pelas cordas vocais, pelo timbre áspero e inflamado, incomoda os ouvidos educados e os sorrisos elegantes.
Olhos alheios assumem expressões de espanto, confusão, cansaço...
A minha solidão é mundana e sagrada, na mesma medida.
Não fossem os perigos da cidade arredia, perambularia pelos bares vagabundos à procura de pérolas brutas dessa gente invisível, ébria, que sangra entorpecida...
Não fossem as correntes do sacramento, dançaria em altares; beberia vinho com santos; cantaria desafinadamente aqueles hinos da infância sob o transe que só atinge aquele que crê fazer parte de algo maior.
Não fosse a realidade insistente, eu até que seria feliz.