BOCA

essa intensa eterna vontade de não ser.

essa profunda vocação para o torto.

o torto me atrai. o confuso, o difuso das luzes apagadas derramadas pelo chão.

o parafuso que não encaixa, a peça que não tem encaixe, o solto.

do amoníaco de augusto, do fétido e do ridículo. do inferno de sartre, da mulher que não é, mas se torna, eu NÃO SOU.

violenta vontade de abrir a boca e deixar rasgar todos os dentes pro escuro e saltar. me soltar dentro disso que eu nãosou.

saltar dentro de mim e sumir afundada afogada nas minhas entranhas vermelhas, sangrentas, chorosas, profanadas pelo ácido mundo que me ingere.

antropofagia.

o mundo me engole

eu engulo o mundo

e da ordem do discurso aos versos íntimos sem ideologia que brotam do cemitério enterrado no meu coração, nós nos tornamos o que não somos.

eu, meu oceano incompreendido, meu barco desolado, onda do mar que bate em movimentos repetitivos nas pedras do cais.

lido com a morte como o futuro lida comigo. as rugas nascem nas minhas mãos como raízes de árvores centenárias que tragam o solo e fundos terráqueos.

o ser e o nada.

o horror.

a náusea

eu sou como o verme que à vida declara guerra,

anjos.

de tanta rutilância, carbono e amoníaco, embriaguei-me de enjoo e apatia.

um brinde,

ao

que

não

sou.

Magda Rocha
Enviado por Magda Rocha em 19/07/2014
Código do texto: T4888163
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