MOCIDADE E MORTE ( Relembrando Castro Alves )

MOCIDADE E MORTE (Relembrando Castro Alves )

Oh! Eu quero viver , beber perfumes

Na flor silvestre que embalsama os ares,

Ver minh'alma adejar pelo infinito,

Qual branca vela n'amplidão dos mares...

No seio da mulher há tanto aroma ...

No seu beijo de fogo há tanta vida

- Árabe errante, vou dormir à tarde

À sombra fresca da palmeira erguida.

Mas uma voz responde-me sombria,

Terás o sono sob a laje fria.

Morrer ... quando este mundo é um paraíso,

E a alma um cisne de douradas plumas:

Não! o seio da amante é um lago virgem...

Quero boiar à tona das espumas.

Vem! formosa mulher - camélia pálida,

Que banharam de pranto as alvoradas

Minh'alma é a borboleta que espaneja

O pó das asas lúcidas, douradas ...

E a mesma voz repete-me terrível,

Com gargalhar sarcástico: - impossível.

Eu sinto em mim o borbulhar do gênio

Vejo além um futuro radiante:

Avante! - brada-me o talento n'alma

E o eco ao longe me repete - avante -

O futuro ... o futuro ... no seu seio ...

Entre louros e bênçãos dorme a glória!

Após - um nome do universo n'alma,

Um nome escrito no Panteon da história.

E a mesma voz repete funerária -

Teu Panteon - a pedra mortuária.

Morrer - é ver extinto dentre as névoas

O fanal, que nos guia na tormenta:

Condenado - escutar dobres de sino,

- Voz da morte, que a morte lhe lamenta...

Ai morrer - é trocar astros por círios,

Leito macio por esquife imundo,

Trocar os beijos da mulher - no visco

Da larva errante no sepulcro fundo.

Ver tudo findo... só na lousa um nome,

Que o viandante a perpassar consome.

E eu sei que vou morrer ... dentro em meu peito

Um mal terrível me devora a vida:

Triste Ashaverus, que no fim da estrada,

Só tem por braço uma cruz erguida.

Sou o cipreste, qu'inda mesmo flórido,

Sombra de morte no ramal encontra!

Vivo - que vaga sobre o chão da morte,

Morto - entre os vivos a vagar na terra.

Do sepulcro escutando triste grito

Sempre, sempre bradando-me: maldito!

E eu morro, ó Deus na aurora da existência,

Quando a sede e o desejo em nós palpita...

Levei aos lábios o dourado pomo,

Mordi no fruto podre do Asfaltita.

No triclínio da vida - novo Tântalo -

O vinho do viver ante mim passa...

Sou dos convivas da legenda Hebraica,

O 'stilete de Deus quebra-me a taça.

É que até minha sombra é inexorável,

Morrer! Morrer! soluça-me implacável.

Adeus, pálida amante dos meus sonhos!

Adeus, vida! Adeus, glória! amor! anelos!

Escuta, minha irmã cuidosa enxuga

Os prantos de meu pai nos teus cabelos

Fora louco esperar! fria rajada

Sinto que o viver me extingue a lampa...

Resta-me agora por futuro - a terra,

Por glória - nada, por amor - a campa.

Adeus! arrasta-me uma voz sombria

Já me foge a razão na noite fria!...

CASTRO ALVES

Antonio de CASTRO ALVES
Enviado por Antonio Tavares de Lima em 14/07/2014
Reeditado em 14/07/2014
Código do texto: T4881175
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