Devagar, quase parando
 
Que ninguém agora jamais me apresse.
Vou devagar, sem pressa de chegar.
Fotografo os pássaros do lugar,
contemplo beija-flores, rezo prece.
 
Tal como fazia Hemingway, do sol
não perco um nascer, nem mais o poente.
Pena que nada do que eu diga ardente
tenha a poesia de um Leminski bemol.
 
Admiro como nunca a luz da lua
e a mais bela obra de toda a Criação
- que ninguém venha me dizer que não:
o corpo envolvente da mulher nua.
 
Sou paciente até com o burocrata
de repartição que, algo almofadinha,
reverente, aponta-me a escrivaninha
de uma rude senhora caricata.
 
Retiro-me bem ligeirinho, incógnito,
pois recupero a pressa num instante,
antes que essa criatura se levante
e carimbe o meu atestado de óbito.


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N. do A. – Na ilustração, um casal de curicacas fotografado pelo autor na praça defronte sua casa.
João Carlos Hey
Enviado por João Carlos Hey em 05/07/2014
Reeditado em 17/07/2021
Código do texto: T4870345
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