(Uma mal traçada prosa)
 
A gente traça um rumo para a vida
Acontece, então, que a vida não obedece
O rumo traçado, destino almejado, o fado.
Engraçado, a vida nunca obedece nada!
Os desejos, os lampejos de glória,
A vitória ou todo o sucesso sonhado.
As pessoas também não...
A vida, de um jeito ou de outro, acaba,
As pessoas vão embora, somem ou morrem,
Deixam de falar com a gente, de repente,
Como se quem tivesse morrido fosse a gente,
Mudam de idéia, de roupa, de amigos, de cidade,
Mudam de status, trocam os sentidos, os fatos,
Trocam de sentimentos como quem troca de sapatos,
Ficam ali sorrindo para a gente nos retratos
E nos deixam sempre sujos os pratos,
Não se lembram nem dos gatos.
Esquecem o “inesquecível”, o que é incrível,
Esquecer aquilo mesmo que prometeram tanto
E que juraram de pé junto nunca, nunca esquecer.
Matam o eterno daquele “sempre”, palavra tão fácil,
“para todo o sempre”, “sempre e sempre”, o sempre
Que seria sempre se não se acabasse, como se não morresse.
A gente para num instante e pensa em tudo como era antes,
Sonha de novo o sonho já tão gasto de tão sonhado,
Veste o mesmo amor já tão surrado, esse coitado,
Que parece mesmo roupa velha e fora de moda,
Rasgada ou costurada, sempre azul, às vezes desbotada.
E depois a gente sai nu a andar errando pela vida,
Assim despido de tudo, assim vestido de nada,
Ri na hora errada, chora na data lembrada,
E se desespera com a palavra calada, presa,
Engasgada na garganta, poema divino, perdido,
Essa palavra morta antes de ser pensamento,
Essa ânsia de angústia que a gente vomita, meio assim
Entre lágrimas numa dor de embrulhar o estômago.
Saudade, talvez o nome ou a idade dessa dor.
E pouco à vontade a gente vai nessa de encarar,
A verdade, a realidade, a irracionalidade de ser,
A imponderabilidade desse silêncio de verdade,
Essa distância de uma eternidade, nossa efemeridade,
Esse deserto onde fomos plantar essa tal felicidade.
E a gente pensa tudo tal e qual, como se fosse normal,
Como se fosse “vou logo ali e já volto”, depois veremos,
Depois teremos, depois seremos, decerto depois queremos,
Mas não sabemos, nunca sabemos, nem mesmo o que temos.
Mais que isso é ainda bem menos do que merecemos.
Mas a gente traça um rumo, e justamente nele,
No maldito rumo traçado, é que nos perdemos..
Marcos Lizardo
Enviado por Marcos Lizardo em 18/06/2014
Reeditado em 13/01/2021
Código do texto: T4849327
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