Gosto de mim
Gosto de mim de amarelo e branco.
Gosto de mim com roupas largas, com unhas sem esmalte e cabelos sem escovas.
Gosto de mim sentada no sofá sem ter obrigações com horários.
Não é difícil.
Envelheci no corpo, mas deixei a alma livre, mesmo quando ela adoece.
Não deixei os momentos tristes me tornarem vítima da vida, porque gosto de mim.
Gosto dos meus gostos.
Dos meus livros, meus discos e filmes.
Gosto da minha solidão e de um dia de cada vez.
Gosto da serenidade que me vem com os anos vividos.
Não é difícil.
Ás vezes, não gosto de me olhar no espelho. Mas se olho, procuro por mim e não por outra pessoa que não seja eu.
Procuro gostar de quem me ama, mas gosto de flertar com vida.
Gosto dos meus óculos que trazem o mundo mais colorido para perto de mim, mesmo nos dias cinzas.
Gosto dos dias chuvosos. O ar sempre parece mais limpo, o verde se torna mais verde, a cor laranja das encostas se torna mais viva e a vida parece explodir em cada trinca do concreto e do asfalto.
Gosto de mim por ainda conseguir ver beleza num mundo que parece engolido pelos problemas.
Gosto de mim por ser gente, por ser humana, por ser um animal. Um animal que se arrepia diante do perigo, que rosna para os inimigos, que conhece o cheiro das crias, que despreza o lhe é insignificante.
Gosto de mim por amar o verão, mesmo quando me sinta derretida. Mesmo sabendo que haverá dias de inverno pois sei que o calor de minha casa me envolverá e eu me sentirei sempre forte.
Gosto de mim por amar viver, mesmo sabendo que a morte acontece um pouco a cada dia e que em um destes dias, ela virá para sempre.
Ainda assim, se houver algo depois da morte, saberei gostar de mim, se algo de mim continuar a existir.
Gosto de mim hoje: de amarelo e branco.