PÓLEN DAS ESTRELAS

Também, ainda, pedido de perdão.

NA MADRUGADA DE 30 DE MAIO DE 2014

Texto escrito em 14 de agosto de 1988

Meu amigo dorme

na noite pura.

Animaizinhos nascendo na floresta

flores de lótus abrindo-se em silêncio

seio materno

brancura

Via Láctea

estrelas de matizes delicados.

Meu amigo dorme.

Desde sonho não sei

mais que um tremor levíssimo de pálpebras.

Sinto a noite se abrindo devagar

e o canto dos mundos indizíveis

acalentando a criança pequenina

flor toda aberta ao pólen das estrelas.

E enquanto dorme

o mundo silencia

seus cânticos de guerra

suas horas pesadas

as árvores sangrando

os pássaros funestos

as palavras que não sabem mais nada

do mundo

de si mesmas.

Meu amigo dorme

e enquanto dorme

sua vida se abre

a um relógio sem pêndulo.

As palavras são cores

as estrelas, ponteiros

por onde flui seu pensamento.

E eu, toda nova

dessa música que brilha

em seus cabelos

- fruto maduro ainda úmido

do parto das estrelas -

fecho também os olhos

e ao útero da noite

confio as minhas asas.

Título original: Meu Amigo Dorme

Do livro ESPELHOS EM FUGA, Editora Objetiva, 1989.

Abraço grande, amigo. Da minha parte, te peço perdão pela vida que não tivemos coragem para construir, há quarenta séculos; se tivéssemos tido tal coragem, talvez toda a nossa história, ao longo desta ainda presente vida, pudesse ter sido melhor, mais plena, menos solitária do que veio a se tornar, a se mostrar. Talvez. Agora, só resta espaço para pedido de perdão, perdão que eu peço. Eu peço. ( Escrita na noite de 28 de maio de 2014)

REPUBLICAÇÃO.