Lenda

Seu corpo esquálido na cama

Era a fotografia da morte

Os olhos no teto pregados

Não se sabe o que via

As mãos se esforçavam

Queriam juntar-se

Queriam ao céu elevar-se

Buscando o amor de Maria

Foram se fechando os olhos

Lenta e docemente

Era uma cena estranha

Quase demente

Uma lufada de vento

Abriu as bandas da janela

Ficou tudo no escuro

Foi-se o último brilho da vela

Ficou na cidade o medo, o espanto

Por toda a parte se dizia

Que a viera buscar um santo

Falavam o que queriam

Inventavam histórias

O que era real virou lenda

Tudo se confundindo

A narrativa rodou o mundo

Rodou a roda do tempo

E não se sabe até hoje

Como aquilo aconteceu

E quem entrou pela janela

Deixando no chão do quarto

De um pássaro desconhecido

Uma colorida pena

E sobre a mesinha do oratório

Um papel com um poema