De Compostela VII
E no barulho dos dias,
calada e reinante,
bule entre ventre e peito
a fria passagem dos anos.
Não digas que me conheces,
não fales como se soubesses,
que nada sabes
e nunca me entendeste.
Nem eu te conhecia,
nem te entendia, não.
Agora que a teia da conversa desfiou
vejo o que antes não via, além
do desejo há mais deserto
do que parecia.
E a culpa não foi tua,
nem minha,
que este vazio que me bule
entre ventre e peito tem vida
própria e caminha
com meus pés e pensa
com meus pensamentos.
E tu não sabias,
nem eu podia prever
que o que me ardia por dentro
pudesse um incêndio violento
na nossa fina teia prender.
Talvez sim pudeste querer
um pouco mais, elevar
uma mão para atingir a Lua,
permitir-te a liberdade dum pirata,
a carícia da ventura,
abordar o risco da felicidade.
Mas nada te preocupe
pois entre desconhecidos mandam
os velhos costumes de Sun Tzu,
tu desandas, eu desando,
e cessa o duelo no campo
não santo. Cruento. Amargo.
Para ti é hora da ida e da chegada
à terra de sempre jamais, onde
está o dos teus lugar.
E no fundo para mim é volta,
retorno ao vácuo dos anos,
insaciada, ávida de encontros
tolos e improvisados,
como goles de tequila com limão
apurados nos bares do Franco,
e da Rainha, e por trás do Campo.
Admito que nunca me situei
fora daqui, desta cidade que amo tanto
sem saber por que.
Confesso que não poderia noutro lado
nem lutar a espada, nem beber tequila,
aguardar que seque este céu alado
se não fosse pelas ruelas da Horta à Faxeira,
do Caminho ao Pombal, e que passar
pelo 15 de São Pedro me traz
recordações de tempos loucos,
em que nos vestíamos de amores inventados.
O tempo passou e contudo não direi
que tenho achado meu lugar,
porque ando ainda à procura dele,
como um pássaro anda à procura do ar.