À luz da lua
Euna Britto de Oliveira
Penso que não preciso ter medo de morrer.
Nasci e recebi tudo de bom,
Tão bom que tenho medo de perder,
Ao perder a vida...
Perder ou ganhar novos dons?
Estou escrevendo à luz da lua.
“A bênção, dindinha lua!
Olha a minha galinhazinha
Que está presa na cozinha
Sem comer e sem beber!”
Foi minha avó quem me ensinou
A conversar com a lua,
Quando eu era pequena.
Já fui pequena.
É a mesma lua.
Gosto quando posso ajudar as pessoas estropiadas
A se refazerem.
Eu estou do lado de cá da casa.
A lua, também.
A estrela d´alva está do outro lado.
Também gosto quando me refaço e vejo
Que não estou mais estropiada.
“Endireitai vossos caminhos...”
A lua já mandou arrumar as camas.
Estendeu lençol estampado de estrelas
Para meu pensamento dormir...
Peço a Deus para cortar todo o mal
Do caminho de meus filhos
E de não sei quantas pessoas mais – de todo mundo!
À Virgem, peço para nos cercar de proteção.
Deus precisa de mim para algumas coisas:
Dar água ao cachorrinho
Animar algumas pessoas
Preparar meu filho para a escola,
Dar-lhe café com leite, ovo quente,
Misto e uniforme impecável;
Fazer a mamadeira do bebê
Aplicar insulina na menina
Dar emprego
Trabalhar num emprego...
Ele precisa de mim para fazer
A musiquinha de ninar, que logo vou esquecer,
Porque é inventada, improvisada:
"É proibido afogar
É permitido nadar..."
(Não lembro o resto);
Ele precisa de mim para providenciar roupa bonita
Para as meninas
Escolher as capas dos cadernos dos meninos...
E eu preciso d´Ele nas pessoas
Nas pedras
Na água
Nas plantas
Nos animais
Nos metais
No ar
Nos sons
Nas formas
Nas cores
Nos risos
Nas dores...
Lençol de espuma no ouro, no aço
No sol e no mormaço...
Sigo...
E passo.
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Escrito em 1980.