CONTEMPORÂNEO DO TÉDIO
CONTEMPORÂNEO DO TÉDIO
Cantei pra vida o tédio,
Fiz dele tinta dessas molduras,
Na qual criei.
Estranho!
Sempre fui amado,
Tenho família,
Tenho amigos,
E sou tão só.
Não é uma solidão doente,
Não existe medo, nem escuridão.
É uma solidão poética, mansa.
Um lápis, uma folha em branco,
Um mundo de caduco!
E uma solidão de coisas...
Em mim
Houve tantas flores,
Que as cores sempre mim foram nítidas.
Embora as primaveras não fossem percebidas,
Sempre houve um sol.
Sempre houve um janeiro pré-carnaval,
Um salgadinho em frevo,
Fui todos os festejos...
Mas gritavam em mim;
Igreja vazia,
Escadaria de romaria,
Altar sem devoção,
Sem santo,
Sem capelão.
Missa de ilusão!
Fui completo na solidão.
Contemporâneo do tédio!
Eu que desci o Capibaribe,
Que não arranquei os meus pés desde agreste.
Não apareci aos amigos,
Não apareci às mulheres,
Não apareci na minha cidade,
Eu...
Homem, muito pouco!
Poeta, muito pouco!
Pobre poeta...
Viveu do tédio,
Fez do tédio canção,
Deu-se ao tédio tão completamente,
Que se viu contemporâneo,
Viu-se maquina,
Viu-se prático,
Portátil,
Viu-se só na solidão,
Viu-se em Salgadinho,
Como ladrão.