Enredo de uma lágrima
À noite escura em correnteza
Surge e vem tão cautelosa
Tal o orvalho da natureza,
Correr-me a face, silenciosa.
Anda sem rumo, sem uma rota
E entristece-me o olhar
Uma ferida em água que ora brota
E que custa a evaporar.
Tem um toque tão frio
Em parecer a um glacial
E se revela em véu sombrio
Sorvendo-me a dor, meu bem letal.
O amargo é seu sabor
E ilusão é o seu cheiro,
O passado é seu motor
E a tristeza, um passageiro.
Tão impossível nos é crer
Que em gota tão cristalina
Seja tão fácil de perceber
Os martírios de nossa sina.
É uma mostra sentimental
Que se liberta de um cativo,
Um caminho que sem final
Busca início sem um motivo.
Talvez uma saudade seja
Dos que já o tempo levou consigo,
Vem a lembrar-me que sempre veja
Que suas lembranças estão comigo.
Porém, a isso nós choramos
Porque as lágrimas nos purificam,
As mágoas expressamos,
De nossas faces se retiram.
Seu mistério ainda segue
Enquanto a sinto tocar-me o peito
E a vejo ir-se antes que seque
Ao coração novo que me há feito.
Agora somos uma fusão
Do nada ou de tudo,
Mas sem a incompreensão
Da lágrima que me rege o mundo.
E se insistes, ó doce choro
Em adornar-me esse momento,
Suga-me a vida, eterno soro
E te abraces a quem me ampare nesse tormento.