DESCOMPASSO PARALELO
Enquanto ele dormia e você escrevia,
Enquanto ele repassava o que viveu,
Olhando o teto branco, estirado na cama,
E você vagava pelo jardim, sob o luar,
Fantasiando e consultando as estrelas...
Enquanto ele só pensava em partir
E você poder, enfim, viver com ele...
Enquanto ele colecionava musas
E você pensava ser a única...
Enquanto a olhavam com malícia
E você dizia já ter dono...
Enquanto cada qual por si
[enquanto tanta coisa,
os compromissos, as faltas,
os improvisos, o sexo malfeito,
o esquisito estranhamento,
o mundo desembestado!]
Criou-se o hiato,
O deslindar das emoções,
Isoladas.
O fracasso.
A verdade.
O sonho dobrado e arquivado.
Palavras de línguas diferentes.
Dois.
Um coração batia sim,
O outro pulsava não.
A chuva caiu e os distanciou.
Ainda mais.
Vendaval do imponderável,
O tempo veio, cotou, julgou.
A um lavou.
A outro ensopou de lágrimas.
A um elegeu vítima.
A outro empossou canalha.
foto: Guacyr Aranha