O andarilho

I

Que formas esta noite me revela?

Que sonhos eu, rapaz, trago no seio?

Sou como destemida e errante vela

sumindo no oceano, sem receio.

Invado o espaço, livro-me da cela,

sou aquele Convidado que aqui veio

para cear no ritual da bela

viagem cuja passagem eu sou o meio.

Meus passos sapateiam é na curva,

onde a luz toda ainda mais cintila,

e deitam sob os respingos da chuva,

chuva de astros que a terra não aniquila,

e fogem, e vão além da lama turva,

e encontram a estrada em sua alma intranqüila...

II

Estou cego, mas amplio minha visão.

Estou surdo, mas ouço o próprio silêncio.

Minha carne pesa menos do que um grão,

minha alma traz em si um abismo pênsil.

Sou um bandoleiro ébrio na amplidão,

tangendo um alaúde que me vence, o

poente se abre em rubra extrema-unção,

e, se o eterno é um dado bruto, pense-o!

Sou uma criança lunar cheia de ardor,

reminiscências, e a luz do porvir

banha meus passos de eterno viajor,

e eu caminho sonhando, a sorrir,

e se sorrio não sei se é por dor,

ou por saber nos meus passos florir.

Vagner Rossi
Enviado por Vagner Rossi em 01/03/2014
Código do texto: T4711110
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