Proposições
Liquidificadores dispersam a tarde
em voláteis formas de algodão.
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Vibráteis ecos sibilam augúrios
entre ferros, tétanos e láudanos epístolares.
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Corpos em fila simulam obediência,
a máquina administrativa gera cadáveres escravos
do medo.
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Azul do céu que me fulguras...
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Ó triste decassílabo de outrora,
choroso desencanto do meu outro...
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Um cão me olha: milágrimas... Derramo flores sobre o estrume,
mas o passeio movimenta o açoite e pasta
a indiferença protocolar de corpos férreos.
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Entre pizzas e falas robóticas
dublês de corpos se apagam na carne,
curto-circuito de sistemas retrógrados...
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Relembro-me olhando pela janela da minha casa o tempo,
os vizinhos, a igreja ao longe, revejo-me na tela da memória
olhando por esta janela aqui, mais moço,
capaz, inebriado de verve.
Agora, velho e acomodado, cheio de responsabilidades,
de novo na janela, o tempo é somente o tempo,
os vizinhos morreram ou casaram-se, a igreja
foi destruída pelos iconoclastas sem perdão
e o mundo definitivamente expõe seu cinema cru
da janela de uma casa onde chora um homem
dos escombros do seu passado.
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Eu ando pelas ruas e vou
arrancando paralelepípedos cheios
de relativismos.
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Aquele homem rude
traz no rosto
o mapa geográfico
do sofrimento autêntico.
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Na fila do ônibus
olhares baços disfarçam tédios,
crianças disfarçam balas, chicletes,
jovens disfarçam tesão, ânsia,
velhos disfarçam dentaduras, morte,
a tarde carrega consigo
uma indisfarçável feição
de inexistência.
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Entre ruas amareladas
e árvores imensas
meu esguio perfil caminha
debulhando sofismas calmamente,
simples como quem descobre
um avião rasgando as nuvens,
belo como quem queima máscaras,
triste como quem se lembra
de um velho amor de infância.
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A noite gira milênios
de seus óvulos de nêutrons.
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O espelho se condiz,
mas não me conduz.
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Sou o tempo badalando na praça
ao meio-dia,
lembrando que o sol ainda arde
e por isso nos convida ao sonho.
Sou o necrológio do pobre jovem, morto
antes de se casar com Eleutéria,
por sinal um nome digno de nota.
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Até onde sei
a vida é bela,
mas eu não sei de nada.
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A lua gira no céu
seu carrossel de lira
sobre ébrios enamorados
da solidão.
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Transmitam-me alegria, vida, poesia,
qualquer coisa que palpite êxtase,
taquicardia, ataraxia, haxixe, lastros de cio
em dóceis lábios, ardor, febre de delícia,
qualquer coisa que ria do Infinito,
gerânio, vulva, vocábulo que se encaixa
ao sentido perfeito, sol que se desprende
de sua moldura de minério, qualquer
coisa, um tapa, um pasmo, um susto, um surto,
um desfibrilador que ressuscite as mais loucas ondulações do existir,
qualquer coisa que faça a vida valer a pena,
o riso da criança, por exemplo,
qualquer coisa que exploda sua luz única,
transmitam-me vida, por favor...