UMA NOTA DE CEM
Ela traz em si o suor humano
E o cheiro desagradável de mãos suadas
Do rude trabalhador cotidiano,
Mas também o aroma suave das pessoas
Que trabalham em confortáveis escritórios.
Uma nota de cem inconscientemente
Provoca ganância e desejos incontidos
Ao homem neste mundo inconsequente.
Faz o ser humano urdir planos escabrosos
Para ter a posse de pelo menos cem delas!
Ela paga o aborto letal de uma criança
Que está há alguns meses no útero materno.
É ela que paga a arma de um crime
Que será algures perpetrado.
Mas ela concede também a felicidade
A tantos corações de homens e mulheres.
Com seu poder de compra oferece rosas
À noiva bela e radiosa
Que vai se unir com um jovem nobre.
É ela que coloca o pão na mesa do pobre
E paga a consulta do médico que salva
Alguma pessoa de uma enfermidade fatal.
Se ela falasse
Haveria de dizer tudo o que se oculta
No interior de suas dobras;
Haveria de se pronunciar
Contra os abusos frenéticos
Daqueles que a possuem.
Se ela falasse
Haveria de exigir
Que não se digladiassem tanto
Para tê-la no bolso
Pelo menos por algum tempo.
Não aceitaria ser trocada
Por garrafas de cerveja
E muitos litros de cachaça
Que embebedam homens viciados.
Há muito tempo não a sinto
Entre meus dedos.
Há muito tempo não vejo
A sua cor azulada.
Quantos sonhos teria para realizar
Caso ela ficasse por mais algum tempo
Dentro do meu bolso, bem fundo!
Porém, tudo isso é pura utopia
Pois só consigo tê-la por alguns minutos.