Hora Azul - Tela de Alex Alemany
POEMA
Eu não quero o teu corpo
Eu não quero a tua alma
Eu deixarei intato o teu ser a tua pessoa inviolável
Eu quero apenas uma parte neste prazer
A parte que não te pertence.
(Joaquim Cardozo, poeta pernambucano, 1897-1978)
ÉS TU QUE ME ÉS, SOU EU QUE TE SOU
Não quero o teu corpo,
pois ainda que não me pertenças, parte de ti é minha.
Também não quero a tua alma,
templo onde o tempo voa enquanto passa risonho,
pois sinto-a junto a mim
mais do que nos meus sonhos.
Não quero o teu corpo,
apenas a brasa que te incendeia
e sacia a fome da carne.
Aprisiona-me nessa rubra teia,
nessa prisão abrigo,
onde permanecerei por livre vontade.
E ainda que me dês asas não voarei,
só o farei
se voares comigo.
Não anseio a tua alma,
somente a embriaguez total dos teus sentidos.
Um barco de ardores,
num mar de suores,
mas que seja breve,
não para sempre,
posto que nada nos pertence.
Não há prazer maior nem mais fértil,
do que saciar a mente, com calma,
enquanto o corpo resta, intáctil.
Só assim és tu que me és, sou eu que te sou.
Só assim deixo de ser, posto que em ti estou.
Não quero o teu corpo,
tampouco a tua alma…
Ana Flor do Lácio