[Prefixo para a dor]
[Para você, é claro]
A algia — gosto desse termo, gosto! E sim, tecnicamente, refere-se à "dor", e em geral, acompanha-se de um prefixo que especifica, localiza até, essa dor, nalgum ponto do corpo [ah, o corpo, essa habitação misteriosa...].
No entanto, para mim, isso só não basta; algia não é só essa tecnicalidade não! Para mim, é dor fria, imprecisa [mas sem prefixo]. Na sua vigência, por sorte esporádica, seca-me a boca, secam-me os olhos, e sinto um aperto fundo no peito... uma vontade de nem ser!
Quando? Nem seria preciso dizer: quando uma perda me é imposta pelas circunstâncias, pelas diferenças de tempos, pela impossibilidade quase gritada de ser com... pela imiscibilidade dos caminhos, isto é, por sentir um rio de vida correr inexoravelmente paralelo, e sempre paralelo ao meu!
A agulha fria, espetada em meu cérebro: um lamento assim, como se quisesse sorver, num só e longo hausto, todo o vazio que me rodeia... suspiro fundo, gelado, mas sem palavras que rompam a barreira dos lábios: “ah, as minhas águas não vão beijar as tuas... ô vida, piedade de mim!”
Enfim, trata-se de uma perda imposta por isto que resumimos numa palavra, vida! Paráfrase do lamento do poeta: ... que poderia ter sido, mas não é, não vai ser... Troco tudo que acabo de te dizer por isto: é uma dor imposta por uma das mortes por que a gente passa, ao longo do caminho!
Vê só, o prefixo que atribuo à minha algia, aquela, que sinto, por sorte, com escassa frequência?
Assim são os fados: nada a fazer, exceto esperar, esperar, e esperar... e torcer para que Camus esteja certo, enfim: diante da fatalidade, só a ironia nos pode salvar [de nós mesmos, ajunto eu].
Há ainda um refúgio onde a bagunça instalada no peito, os estilhaços das sensações em desalinho tentam se arreglar: fica nas tramas de um poema, esse lugar... quem sabe... ah, se eu tivesse esse talento!
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[Desterro, 13 de dezembro de 2013]