PERDAS E DANOS

“da vez primeira em que me assassinaram

perdi um jeito de sorrir que eu tinha...”

Mario Quintana.

Numa tarde qualquer visito a casa

dos mortos, e abre-se o peito

em alas de ciprestes.

O canto é fundo, a vida esquálida.

Há um Cristo dentro de mim.

Tantas almas perdidas em cruzes...

Viver é o fio de linha equilibrando

vida e morte.

Amo meus mortos, e o amor é tudo.

Sibila o cicio do vento de outono,

a Voz do Mundo sussurra ao ouvido:

- Tudo é renovação no carisma

de hóstias e sangue!

O vinho é a ferida consagração.

Poesia é choro, na voz amada:

facho de luz fundeado nas trevas.

Somente a poesia resiste às ausências.

O sol tropeça no crepúsculo...

Boca soletra o rito

das perdas e danos.

Do livro OVO DE COLOMBO. Porto Alegre: Alcance, 2005, p. 58.