A morta (à memória de Maria Senhorinha, falecida em 20 de novembro de 2013)

Toquei-lhe as mãos e a testa

E senti a frialdade da morte

Sussurrei-lhe uma prece

E senti a frialdade da morte

Que mistério naquele machucado corpo se escondia

Naquele corpo que foi recém-nascido

Um dia

Parecia cera aquele rosto coberto de nada

E da frialdade da morte

Morta e orgulhosa

Morta entre a seda e a rosa

Ali os parentes da frialdade

Do distanciamento

Das memórias de alguma maldade

Senhora de si e do mundo

Ignorava os familiares reunidos

Apenas as velas e nenhum dos sentidos

Ignorava os companheiros do fim

Em outros caixões

A pequena imagem de uma santa ao lado direito colocada

Era a morta, a santa, a indiferença e o nada

Ainda gelam em mim

A fealdade e a frialdade da morte

Por aquela finada execradas