ONTEM
Perfume tenro toca meus lábios
Teus pensamentos me são pássaros
A lua ingrata inunda meu quintal
Das coisas que guardei por muito tempo
Tua fronte lúcida e tenaz
Inibe meu corpo covarde
Pusilânime, escondo-me por detrás da cortina
Há visitas na sala-de-estar que não consigo ver nos olhos
É estranho ver o corpo desgarrado da cerviz
Por não ter visto o golpe iminente do carrasco
Estranho o peso do corpo
Quando se orbita por demasiado este planeta
O tempo enrugou minhas mãos
Amassou minhas vestes
E deixou velha a lembrança do dia em que
abriste para mim a porta de tua alma
De tua casa me recordo das loiças e pratarias
Não o cheiro de tua cozinha
Nem das dobras de tuas cobertas
Recordo-me da sala e dos quadros
E de seus detalhes
Mas não do calor de tuas mãos sobre as minhas
Quando refestelados na poltrona, "não-assistíamos" a nada
Pois nada faltava e teu sorriso bastava
Para alimentar o meu dia