Percalços

Já não sou eu que vivo...

é a tua ofensa que vivifica em mim

a construção de novas ideias.

Veja, o piano está sorrindo

e eu ávido de tantas partituras

vou a janela e nela vejo o sol

dialogando na terra em ardor

solvendo água como se solve em mim

a paz que já não tinha...

E eu que não sou pastor

não tenho ovelhas a pastorear

nem ninguém a dar vida

nem quero cobertor

porque não tenho frio...

sinto arrepio do beijo da traição.

É vaidosa a nossa sensatez

nela a palavra não se faz carne

como não se tolera perdoar...

como se multiplica em preguiça

abstrata de uma boa nova

vazada em terreno pedregoso.

Na cruz meu corpo treme

preso pelo tempo ríspido

que não me fiz mergulhar,

como agora seja,

ora frio

ora rio de mim mesmo,

a tentação

de estar apedrejado

pelo ato de amar.