Hoje

Hoje

Hoje, acordei com vontade de dormir.

Bocejei e olhei o mundo da janela

O dia está muito bonito. Chuvoso.

Meu dia lindo é assim!

Carros, com suas buzinas gritantes,

despertam a minha paciência.

Como é difícil ser Jó nessa vida!

Perco-me no meio da multidão.

Eu sou o outro para os outros.

A vida me dá placas de direção

- Rua tal, avenida ali e números –

números de CPF, identidade, PASEP.

Sou uma sequência numérica,

mas vou na contramão do caminho.

- Bom dia! - Vá em paz! - Fique com Deus!

Gentilezas decoradas e repetidas, amiúde.

A obrigação da desculpa e do perdão.

Perdoa por eu ser, não, por eu não ter.

Marcas, grifes se esbarram pelo trajeto.

homens saem vestidos de humanos na vida.

Tudo está em seus devidos lugares:

o céu, a terra e os seus movimentos.

Só um pássaro destoa no meio da vida.

Ele entrou de gaiato no poema – não conta

O vento sopra e assopra o pecado.

A saia da pureza levantou-se – Meu Deus!

O pecado e a vida saem do mesmo lugar.

A pomba defecou na minha cabeça,

ela faz parte de toda a história – contexto.

O celular toca – quem está do outro lado?

Tráfego de informações, trânsito congestionado.

Tudo parado no percurso, tudo com tudo.

Apenas um cachorro passa correndo na rua,

mas não o quero latindo no poema.

alguns se empanturram de vontades

e outros se fartam com pão, peixe e “verdade”.

Eu tenho as fomes que me são de direito.

Como como! Como como! Como como!

Farto-me de carne humana e de mim.

Ah, antes que eu me esqueça!

Tudo isso porque deixei a onicofagia

e, também, é claro, a autofagia.

Um pássaro passou pelo meu poema.

Coitado! Um gato acabou de comê-lo.

É a lei da vida e é a vida querendo viver.

Acendi um cigarro, mas eu não fumo.

Apaguei-o e voltei para a vida – rotina.

Mário Paternostro