O VÔO DA GARÇA
Era uma vez uma garça
que sonhava conhecer outros mundos
que sabia existirem longe, bem longe,
além fronteiras...
A cada dia alçava vôo
e pesquisava, pesquisava.
Voltava ao entardecer.
Ficava a pensar no que haveria do outro lado.
Mas que lado?
Sempre que voava, era um vácuo sem fim.
Subia, subia, e nada.
Aqui existia o ar, que a fazia voar.
A água, na qual se deliciava em banhos
e que lhe dava peixinhos dourados p'ra bicar.
Existia a terra fofa cheia de verdes e de cheiros
que lhe enchiam os olhos e a alma,
se é que alma possuía.
E também o fogo, que maldoso,
já vira destruir florestas inteiras sem dó.
Mas, e lá em cima, o que seria?
O que haveria de ter além daquelas alturas
que formavam o azul tão intenso
visto aqui de baixo?
Seria alguma substância? Éter, como diziam alguns?
Por isso voava, voava, voava...
Cada vez mais alto para descobrir
e ganhar aquele mundo desconhecido.
E sempre voltava.
Um dia, quando o sol ainda não havia despertado,
resolveu empreender mais cedo sua viagem.
Desceu à lagoa, fartou-se de peixes,
conversou com as borboletas,
aplaudiu o coral das abelhinhas
que buscavam nas flores o néctar.
Aspirou o ar impregnado do aroma da primavera
e voou.
Voou longe, longe, até sumir no azul dos céus.
Não voltou mais.
Se encontrou o mundo que buscava, jamais saberemos.
Levou consigo o segredo do outro lado.
Aquele lado que jamais mortal algum
haverá de conhecer!