rascunho
esteve ali
até ontem
ao lado da estante
o desenho feito
pelo menino
de cabelos azuis
que tanto me encantou!
sombras e
luzes dispersas
de dissimulados
olhos
e aflitos
retinas
em giz
e íris
em arcos
outros
face a face
e em redor
de um outro
e mesmo rosto
pois:
por ali
houve também
barcos
velas
saveiros
veleiros
horizontes
céus negros
e sóis
mas tudo
ridiculamente
vão
perto dos olhos daquele menino
de cabelos azuis
arregalados
ali
até ontem
devias ter visto, irmão
tanto foram mais
aqueles olhos
águas demais
mas só até ontem
o desenho do menino
ali onde esteve
a imensidão
da palma do lábio
em silêncio
a saber
e nada dizer
das cicatrizes
de lá do bem-fundo
a forma de lutar
contra o rosto disforme
que sempre foge
da verdade
de se refletir
enfim
em Si bemol
toquei para o menino
a canção que ele mais
queria ouvir
fez-se um silêncio
que só
devias ouvir
esteve aqui
comigo
até ontem
...........
ah, meu caro irmão
mais que a brisa
que havia na mão
da irmã que toda
manhã
me bendizia:
-Deus à frente, meu filho!
mais que a menina
de olhos vidrados
a revirar-se em visões
e em voz
de "Tanto Amar"
mais que em noites
de quintas
em noites de preces
mais que a fé
do pregador
a mentir e
mentir
e
sorrir
até
mais que os cinco graus
à sombra
e a notícia de neve
ao sul
e ao norte
os montes impossíveis
mais que a leste
a lua
e a oeste
a maldita lua
também
num quase desviar os olhos
de mim
o desenho do menino
me fez companhia
por esses dias
tais
não obstante
meu hálito
ruim
esse meu meio cheiro de gim
esse meu meio gosto de resto
que trago na alma
devias ter visto,
meu irmão
pelo jasmim
dono do campo
de debaixo da torre
onde nada floresce
juro
pelo lírio
de uma foto que vi
num poema qualquer
feito retrato
de vida
em algum lado de estante
delírio
talvez
mas juro
ainda assim
por tanta coisa, irmão
será mesmo
que não estivemos nós
também na estante
até ontem?
antes mesmo de Deus?
não ria
o rio
ri calado
e abaixo
e eterno
sejamos assim
dá-me notícias
das águas de lá
dos braços
das corredeiras
das vertentes
deixa uma reza
um abraço
um atalho
um retalho de amor
e para quem
bem me queira
leva esta barba
estes olhos fundos
e estas mãos assim:
chego
em primeiro inverno
tens minha palavra!
que coisa!
esta minha palavra empenhada
que apanhei
em pés de morros
aos pés de mortos sentimentos
e modos
vá que valha mesmo
verdade
a minha voz:
seria tanta besteira
essas tuas águas, irmão
Lembras que sempre
era tarde?
a noite sempre
foi tarde
e seca
e a voz
de nossa mãe
seca
e toda aquela
estação?
ah, meu irmão
não nunca nos foi dado entender
dessas coisas mais tristes
dessas coisas tão verdadeiras
seca teus olhos
dá tua mão
a partir de amanhã
as manhãs serão azuis