FOGO, PALHA E LENHA 3

O fogo deseja queimar

e, queimando, consumir-se

junto a tudo que toca

em seu devir infinito.

Pois foi pra isso que nasceu.

Seu encanto descontínuo

está no devorar-se todo

se lançar ao precipício.

Busca arder até queimar-se

em seu próprio calor íntimo,

incendiar na própria alma

o prazer mediante o risco.

***

A palha é ser não sendo,

sombra do que não existe.

Antes erva, flor silvestre,

hoje morta, ressequida.

Pelo vento que a carregue

busca ela seu destino.

Sem ser, somente estando

em constante destruir-se.

Indo de um lado a outro,

de um lado a outro indo:

A palha que só memória

quer também o extinguir-se.

***

Seria acaso o encontro

entre seres tão distintos,

mas que tão ardentemente

pra si optam o perigo?

***

A palha logo mostrou-lhe

a voz frágil feminina,

quer doar-se ao contato

em um elo de lascívia.

O fogo à dama atende,

com os longos dedos ígneos

abraça-a num de repente

entregando-se ao limite.

Juntos palha e fogo ardem

a loucura do seu risco,

um fazer a desmanchar-se

em alturas nunca vistas.

***

Mas foi só fogo de palha

que se foi com um sorriso

deixando o fogo cansado,

deixando o fogo sozinho...

***

A chama de tão cansada

buscou onde esvair-se

de sua agora vida pouca

num rápido extinguir-se.

Ao pé da lenha sentou-se

como que a pedir abrigo

em sua crespa carnadura

de tempos idos, antigos.

Da sua solidão velada

abre a lenha entrelinha,

não partilha do encanto

de ser chama ao princípio.

***

Mas o fogo abrigado

aos poucos recuperaria

a força que antes tivera

no outrora de sua vida.

***

Ela sente lá por dentro

no calor, as eras idas...

em seu ocaso lembrou-se

que não era mais sozinha

Deixou-se arder livremente

ao fogo que se expandia

como um alguém tão próximo

e como um alguém que queria

mantê-lo, sim, tão próximo.

Até que acabasse a vida

ardendo juntos o tempo

em que o calor duraria.

Seria uma história de amor?