A VERDADE
A verdade é a palavra perfeita
um rio inquestionável que corre na direcção
dos campos limpos e dos arrozais eternos
sempre prontos para serem colhidos
e onde se abastecem os anjos da guarda
do universo voando sobre a sua água
com suas asas protectoras abertas
A verdade é um palácio transparente
com a clareza cantante do cristal
a força impenetrável do diamante
o ofuscante brilho do sol do meio-dia
semeando luz por entre as sombras
na festa das primaveras perfumadas
por flores resistentes e invencíveis
enraizadas nas penumbras da fala
onde deveria habitar o silêncio
A verdade tem um corpo frágil
todavia reprime-se de pudor
é um castelo visível à distância
dos olhos dos homens e parte-se
no chão do burburinho
sempre que treme por alguém
lhe virar as costas à inocência
Não usa espadas resplandecentes
é a verdade completa na sua perfeição
e anda de rosto descoberto nas ruas
despojada de máscaras de medo de futuro
não foge nunca aos tumultos
e às vezes sucumbe
abrindo o peito
a qualquer arma que a fira
É a verdade o alvo preferido
do seu verdugo predestinado
um fantasma de mercúrio
que mesmo sozinho
mata-a em silêncio e de mãos vazias
Navegando nos mares da ignorância
não resiste a destruí-la à frente da evidência
esmagando-a de sobranceria e desprezo
na cinza do coração do mundo
e sem problemas de consciência
ri-se depois
encapuçado por uma simples
mentira
José António Gonçalves
(inédito.1.04.04)
JAG
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