Ser
Sou como acorde que vaga no espaço
fazendo vibrar as notas do compasso
da música da vida, da música da morte;
eu vou além do azar e vou além da sorte.
Sou um poeta matutino acordando com as flores,
se misturando a essa seiva me tornando cores,
então me despeço e regresso aos jardins
tão acústicos e esdrúxulos, perto do fim.
Sou como a corda no pescoço do enforcado
que não escapa a vida, sofrimento continuado;
sou cão alado, latindo parábolas siderais
pelas desilusões e nada ou algo mais.
Agora eu sou somente a tinta da caneta
entremeio as caretas no espelho convexo
tentando encontrar nexo nessa caminhada
que não tem parada, vai da noite até a madrugada.
Sou como o acorde que vaga no espaço
de um segundo, de um minuto, de eternidade;
sou inascido, não tenho idade, fico a vontade
sem rédeas, sem nacionalidade... Racionalidade.
Sou como a estrofe final da poesia e o fim do dia
que agiganta os sentimentos gritados aos ventos
que bocejam na face cansada e pálida do mundo;
sou somente eu, nem mais raso, nem mais profundo.