já tarde
agora que dormem
as flores
e o verde
agora que cinza
vem a menina me dizer:
- dá tua mão
agora que eu
besta
(desde menino)
agora que já
nem me lembro mais
do quanto devo
sofrer o frio na espinha
dos pés
lá no findo pomar
agora que era
ainda a casa antiga
onde as cantigas de
ensinar
nos cuidavam talheres
e afazeres
e obrigados dizeres
de não há de quê:
- a bênção, padrinho
agora que os
deuses do mal
já não vêm nos buscar
(e não vieram nunca)
meninos que esperávamos
agora que
as coisas todas
e mais tristes
já foram todas as coisas
e tão tristes
agora que as flores dormem
e o verde
agora que cinza
vem a menina me dizer:
- dá tua mão
ah, quem me ouve
agora
quem me crê
quem me cruze a testa
em cinzas
de fé:
empresta-me
o gesto
de domar o vento
e ensina-me o olhar
de um olhar mais azul
agora que cinzas
agora que inverno
agora que quero tanto
frio
agora que só
e mesquinho
vem a menina me dizer:
- dá tua mão