já tarde

agora que dormem

as flores

e o verde

agora que cinza

vem a menina me dizer:

- dá tua mão

agora que eu

besta

(desde menino)

agora que já

nem me lembro mais

do quanto devo

sofrer o frio na espinha

dos pés

lá no findo pomar

agora que era

ainda a casa antiga

onde as cantigas de

ensinar

nos cuidavam talheres

e afazeres

e obrigados dizeres

de não há de quê:

- a bênção, padrinho

agora que os

deuses do mal

já não vêm nos buscar

(e não vieram nunca)

meninos que esperávamos

agora que

as coisas todas

e mais tristes

já foram todas as coisas

e tão tristes

agora que as flores dormem

e o verde

agora que cinza

vem a menina me dizer:

- dá tua mão

ah, quem me ouve

agora

quem me crê

quem me cruze a testa

em cinzas

de fé:

empresta-me

o gesto

de domar o vento

e ensina-me o olhar

de um olhar mais azul

agora que cinzas

agora que inverno

agora que quero tanto

frio

agora que só

e mesquinho

vem a menina me dizer:

- dá tua mão

Capiau da roça
Enviado por Capiau da roça em 20/06/2013
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