Numa conversa com o sol
Ouvi, ó homens-poetas!
Eu descobri tarde dessas
Numa conversa com o sol
Que ele – que é como um deus flamejante
Sente uma certa inveja
Da vossa ínfima condição.
Ele que já regeu eras
Que alumia o oculto
Disse-me ser, lá no fundo
Um poço de escuridão
E em quem crepita, em silêncio
Um inane coração
Um grande músculo inativo
Impalpável, rígido...
Que nunca amou a ninguém.
Ele, uma estrela suprema
De rota quase imortal
Disse-me não compreender
As vossas noites adentro
Onde vós, “quase uns micróbios”
Podeis sonhar
Vos expandir
Vos espalhar
Girando a roda da vossa própria história
Sem desejar transcender
Sem precisar explodir.
Depois dum triste suspiro
O sol me olhou sobre os ombros
E, enfim, se pôs, taciturno
Antes, porém, quase humano
Passou delicadamente
Seus dedos de fogo-morno
Na pele dura do dia.
Eu pude então perceber
Que se pudesse, acaso, escolher
Ele esperaria pela noite
E ali, sem flama alguma de inveja
Depois de se arrefecer
O sol (não sei se feliz)
Faria o que sempre quis:
Amar
Rimar
E morrer.