NASCENTE
Num veio cristalino
Um fio d’agua
Se pronuncia
Rompe o ventre
A vastidão da terra.
E um rio logo corre
Célere, vigoroso
Cavalo de água
No verde dorso da serra.
Seus fios de teia
De renda molhada
Seus passos de fera
No fundo das grotas.
Amansa cantigas
De amores e tempos
De luas meninas
Planícies e ventres.
Um rio serpenteia
Cá dentro da mente,
Um rio de versos
De lendas e lavas
Desceu num galope
Sem rédea
Nem freio.
Um rio
Um poema
Surgiu de um grotão
De um vão
De uma lavra.
Rompendo os limites
Os véus do desejo
A língua, o silêncio
E a sina dos medos.
Um rio
Um espelho de águas
Enchentes,
Vazantes, e lagos
E mares
Saltando os altares
Profanando as gentes.
Um rio
Um braço
De mar desgarrado
Correndo liberto
No leito das veias.
Descendo as montanhas
Os vales, as serras
Nasceu de repente,
Em meu corpo
De terra.
Sandra Fonseca