Pequena-Grande-Pequena

Talvez eu ainda seja menina

Com meus quase trinta anos.

E ainda brinque de esconde-esconde

Com todos os sonhos, na madrugada.

Saia correndo na chuva,

Desviando dos pingos gelados,

Sem medo de me resfriar.

E chegue a casa em sopa.

Mas com um sorriso inocente

Estampado nos lábios.

Talvez eu ainda possua dentro d’alma

Toda aquela inocência

Dos meus quatro, oito anos.

Cultivar o que foi proveitoso

Não é perda de tempo.

É ganho absoluto.

Talvez eu tenha aquele brilho todo

Dos quinze, dezesseis.

Um brilho quase infanto-juvenil.

Coisa simples, cabível a todos os olhos.

Talvez eu ame a espoletice.

Um pouco mais recatada, no entanto.

Sem muito holofote.

Com menos glitter, menos lantejoula.

Mas, no fundo, um leve brilho

Nunca faz mal a ninguém.

Desejo o doce pela manhã.

E, embora eu azede no meio do dia,

À noitinha peço ao Pai

Que me açucare novamente,

Enquanto adormeço.

Perco muito o sono, madrugada adentro.

E confesso ser isso ótimo para minha inspiração.

Inspiro-me muito mais

Ao som dos grilos

E à luz dos vagalumes e do luar.

Coisa muito brilhante

Ofusca-nos as vistas

E nos cansa o olhar.

O brilho na medida certa encanta.

O jogo do não revelar instiga.

Já escrevi tanto na vida

Que, quando me pego relendo-me,

Impressiono-me comigo mesma.

Com essa capacidade toda

Que brota das minhas mãos

Que passa para o papel

Em prazo de cinco minutos.

A cabeça pensa rápido demais.

É como se a mão fosse sozinha.

E no final, tudo fica bom.

Tudo encaixa perfeito.

Talvez seja isso um dom.

Não sei explicar.

Não sei se sou eu mera ferramenta,

Ou se trago isso das vidas muitas.

Só sei que o faço com a alma.

Inspiro-me tem dias

Pelo simples olhar do cachorro da rua

Que quase suplica um pão e um afago.

Isso sem dúvida não escapa do meu olhar.

E penso, ainda, como pode

Haver ser humano que finja não vê-lo.

Sou das melodias, dos blues...

Sou das entonações cheias de firulas.

Dos versos cheios de borboletas.

Sou das cores mais delicadas

E também do preto e do mistério.

Tenho fases, também.

Não como a lua.

Mas como a mim mesma.

E poucos são os que já me traduzem sem dicionário.

Por falar em dicionário,

Agradeço a Aurélio Buarque de Holanda Ferreira

Por sua maravilhosa criação.

Caminha ao meu lado,

Como bíblia ao crente, servidor.

Posso não consultar a bíblia por completo.

Mas, o dicionário...

Ah! Sem dúvida eu o necessito!

Amo ficar lendo e relendo os vocábulos, os verbetes.

Isso me traz conhecimento linguístico

Para que meu conhecimento de alma

Seja mais bem interpretado.

Todos, creio eu, deveriam tê-lo ao alcance,

Todos os dias...

Dicionário à parte, cabeça flutua

Ao som doce de um Vercillo.

Nobre poeta das luzes da madrugada.

Traduz e inspira meus pensares

E auxilia-me a transpor

Tudo o que segue no coração.

Sou pequena-grande.

E também grande-pequena.

Sou menina-mulher.

E também mulher-menina.

Com doçura.

Com aspereza, em dias de tempestade.

Com medo da chuva forte.

Com aquela ousadia na ponta da pena.

Com aquele brilho nos olhos,

Ao abri-los, às três da madrugada.

Com o amor nas veias,

Feito fonte inesgotável de sobrevivência.

Sou assim, essa mistura louca...

Que talvez encante.

Que talvez provoque repulsa.

Ou mesmo interrogação.

Sou doce de leite cremoso

Para se saborear de colherzinha

Em noites de insônia.

E... Ah! De insônia

Eu posso dizer que entendo...

E como entendo!...

HELOISA ARMANNI
Enviado por HELOISA ARMANNI em 31/05/2013
Código do texto: T4318234
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