Marcas Profundas

A floresta deixou suas marcas

No meu ser

Meus olhos de águia

Guia-me de dia

Minhas pupilas de corvo

À noite

Meu sangue é verde

Como as folhas das matas

Como os igarapés

Ora cristalino

Ora escuro

No meu umbigo moram cardumes

De peixes agressivos

Mas que passam a nadar em águas

Mansas

Quando escutam o canto

Da minha nereida

Eu que tomei seiva das árvores

Sagradas

Saciei minha sede com água

Do apuí mariri

Comi as féculas das pupunhas

E piquiá

Escutava o canto da uiara

Nas horas vagas

O vento nos poros do bambu

O arroio da nambu

O encantado canto do rouxinol

A canção do uirapuru

Os versos do sabiá

Ela deixou seus ensinamentos

No meu coração

De curumim

A visão da vida nos meus olhos

De caapi

A conjugação dos verbos

Para os tempos difíceis

Para os momentos de eternidades

Quando cheguei à cidade

Fiquei confuso no cais

A Maria-Fumaça que vem e passa

E tive que tomar um sumo negro

Numa cuia de vidro retorcido

Comer peixe na tigela

Com um tridente contorcido

Senti saudade

Muitas saudades condoídas

Minha canoa

Meu corpo nu

Minha alma tupi silenciosa

Meus olhos encantados

Meus pássaros que emprestavam

Suas asas para eu voar

Pelos céus

Meu primeiro amigo da cidade

Foi um grilo

Ele também parecia confuso

E perdido

Solitário aturdido

Grilado

Queria ultrapassar a vidraça

De uma janela

Por que do outro lado

Estava o horizonte azul

Ajudei ele alcançar seu horizonte

Conversamos muito

Nunca mais o vi.

Luiz Alfredo - poeta

luiefmm
Enviado por luiefmm em 26/05/2013
Reeditado em 26/05/2013
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