NO DIA QUE ELE MORREU
NO DIA EM QUE ELE MORREU
ENTREI EM SEU QUARTO
PRA FAZER O QUE ELE PEDIU
JUNTEI OS JORNAIS QUE ELE ESCREVIA
E GUARDAVA À TOA
AS CRÔNICAS DO DIA A DIA
ERAM VÁRIOS OS JORNAIS
NO DIA EM QUE ELE MORREU
ARRUMEI UMA CAIXA
BEM GRANDE PRA POR TUDO
QUE ELE PEDIU
COISAS BOBAS QUE ELE GUARDOU
NO TEMPO EM QUE ELE VIVEU
ERAM DOIS OS TRÊS CELULARES
UMA PASTA DE DOCUMENTOS
NA PRATELEIRA JOGADA
AS ROUPAS QUE JÁ NÃO USAVA
AS ROUPAS QUE NUNCA USOU
E QUE JAMAIS VAI USAR
A BÍBLIA QUE ELE SEMPRE LIA
O TERÇO NO QUAL SEMPRE REZAVA
OS DISCOS DE CHICO E TAIGUARA
QUE ELE SEMPRE ESCUTAVA
TUDO NA CAIXA JOGADO
NO DIA QUE ELE MORREU
OS VÍDEOS QUE ELE ASSISTIA
DE MONTENEGRO A MAYSA
AS CONTAS PAGAS ARQUIVADAS
AS NÃO PAGAS PENDURADAS
OS LIVROS QUE ESCREVIA
AS POESIAS QUE NINGUÉM LEU
TUDO NA CAIXA JOGUEI
NO DIA EM QUE ELE MORREU
NO DIA QUE ELE MORREU
ABRI SEU ARMÁRIO TRANCADO
QUE NINGUÉM OUSAVA MEXER
O QUE NELE TINHA GUARDADO ?
SÓ LEMBRANÇAS DE VOCÊ !
LEMBRAS DA COLEÇÃO
DE FOTOS QUE ELE FAZIA ?
TUDO ALI AINDA ESTAVA
NENHUMA ELE PERDIA
PRA ELE ERAM SAGRADAS
COMO UM TESOURO, GUARDADAS
NO DIA QUE ELE MORREU
JOGUEI TUDO NUMA CAIXA
BILHETES DE AMIGOS
RECADOS DE AMIGAS
HISTÓRIAS DE PAIXÃO
TUDO DENTRO DE UMA CAIXA
GUARDAR NEM TINHA RAZÃO
DA CARTEIRA DE DOCUMENTOS
TIREI AS NOTAS DE VALOR
AS OUTRAS ENTERREI COM ELE
VÁ ELE PRA ONDE FOR
NO DIA QUE ELE MORREU
ACHEI NUM CANTO DO ARMÁRIO
A PEQUENA AGENDA DOURADA
ONDE ELE ANOTAVA
AS PROMESSAS QUE PARA TI FAZIA
DE NADA ELE ESQUECIA
MUITAS PROMESSAS CUMPRIDAS
COMO VIVER SÓ PRA TI
OUTRAS POR CAUSA DO TEMPO
SEM CULPA DEIXOU DE CUMPRIR
TINHAM RECADOS ESCRITOS
COM TODO TIPO DE COR
UNS MANCHADOS DE SANGUE
OUTROS APENAS DE DOR
COMO SE ESTIVESSEM MOLHADOS
COM GOSTO DE ÁGUA SALGADA
NO DIA QUE ELE MORREU
NADA ELE LEVOU
ESTAVA TUDINHO ALI
DO JEITO QUE ELE DEIXOU
DEPOIS DE TUDO GUARDADO
A CAIXA FECHEI COM CUIDADO
FITA ADESIVA PASSADA
NA TAMPA DEIXEI RABISCADA
"DEVE FICAR A SAUDADE
NINGUÉM PRECISA SABER
DA FORMA QUE ELE PARTIU
BASTA VOCÊ SABER
QUE SÓ PRA TI MANDOU ADEUS"
NO DIA QUE ELE MORREU
LEVEI A CAIXA FECHADA
LÁ PRO FUNDO DO QUINTAL
PERTINHO DA GOIABEIRA
FIZ A PEQUENA FOGUEIRA
COM TUDO QUE ELE DEIXOU
PARECE ATÉ BRINCADEIRA
AS FIGURAS QUE A FUMAÇA FAZIA
INCRÍVEIS LEMBRANÇAS
QUE NELE EXISTIAM
TINHA ELE SORRINDO
COMO SE FOSSE PRA TI
TINHA ELE CHORANDO
COMO SE FOSSE POR TI
TINHA ELE PENSANDO
COMO SE FOSSE EM TI
TINHA ELE CANTANDO
AS MÚSICAS COMPOSTAS PRA TI
ENGRAÇADO
PENSANDO BEM AGORA
TUDO O QUE ELE FAZIA
SEMPRE LEMBRAVA DE TI
DEPOIS DE TUDO PASSADO
VOLTEI AO QUARTO VAZIO
A CAMA DESARRUMADA
COMO SEMPRE ELE DEIXAVA
LENÇOL CHEIRANDO A SAUDADE
TRAVESSEIRO CHEIO DE SEGREDOS
QUE ELE DESABAFAVA
UM TELEFONE NO CANTO
PELO QUAL SEMPRE MANDAVA
UM BOM DIA PRA TI
ANTES DA MADRUGADA
VIRAR DIA SEM FIM
O TELEFONE JÁ NÃO TOCAVA
O COMPUTADOR JÁ NÃO LIGAVA
ERA SÓ UM QUARTO VAZIO
COM A PORTA SEMI ENCOSTADA
NO DIA QUE ELE MORREU
NA TUA PÁGINA DE RECADOS
JÁ NÃO TINHA EU TE AMO
JÁ NÃO TINHA BOM DIA
JÁ NÃO TINHA O PRA SEMPRE
QUE ELE SEMPRE DIZIA
SEQUER HAVIA SAUDADES
DELE NINGUÉM JÁ LEMBRAVA
ELE JÁ HAVIA PARTIDO
VOLTADO PRO MESMO LUGAR
DE ONDE HAVIA PARTIDO
ALGUNS DIAS MAIS TARDE
NINGUÉM SEQUER SE LEMBRAVA
QUE ELE HAVIA EXISTIDO
NINGUÉM SEQUER SE LEMBRAVA
DO QUE ELE HAVIA SENTIDO
POR QUEM HAVIA CHORADO
A QUEM ELE HAVIA AMADO
MAS HOJE NÃO
HOJE É O DIA EM QUE ELE MORREU
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