ROMPANTE

Jogaram os fantasmas no precipício

Longe de mim tudo é vazio

Sou o que resta de um sonho acordado

A cicatriz de um corpo que caiu

Não me cabe a autoria do tombo

Quis sonhar o que não devia

Interditos interdizem comuns dizeres

Sou o que restou exposto

Da minha tardia alegria

Sombras de um sorriso esquecido

Olhos parados num horizonte tardio

Enfim sou a ausência da noitinha

O não ser dividido entre cores e breu

Cinza chumbo cinza dia

Grito choro estou sozinha

Sou apenas uma nau sem destino

Ou presa ao mar sou perdida

Jogaram as ilusões ao vento

Sem elas resta em mim

O rabisco de uma triste menina

Sou medo e sombras pequeninas

Tentativa de ser quando termino

Ponto final perco a expectativa

Não consigo retê-la em vírgulas

Busco a mulher no ventre

A cicatriz do umbigo

Queria preencher-me viver em mim

Apropriar de um novo nascimento

Cortar no corpo a ferida do princípio

Quantas fronteiras cruzei na busca

Prendi-me nos cantos limites

Seduzi o céu tentei salvar-me

Indiferente não me percebeu

Chorei o desencontro na avenida

Hoje choro grito estou sozinha

Permaneci sendo apenas tentativas

Libertei o vento não mais me acaricia

Deixei o véu cair na face da melancolia

O céu perdido de tantas estrelas

Quis ser a única em meu caminho

Soltei o destino o que estar por vir

Futuro distante não mais domino

Insisti no sonho tentei me resgatar

Dormi o devaneio insistente

Loucuras rotinas desatinos

Minha vida em sangue exposta ao mundo

Gritava na boca dos outros

Palavras feriam meu corpo

Caí ao chão não fui dona do tombo

Em lágrimas roguei o esquecimento

Tentei apagar os inocentes sorrisos

O corpo marcado corpo de cicatriz

Sou sombra do que fui

Marca no tempo vestígios de dor

Rugas nascem em meu espelho

Vejo-me maculas impróprias

Conheço-me no abandono

Excruciar-me excruciá-los tanto

tanto em quê?

Vigiai-me a alma no cativeiro

Misérias angústias se desvelam

Nuas em mim tentam me condoer

Vão intentos não mais ferida

Lembranças duradouras adoecem

Corpo retalhado em velhas cicatrizes

Sinto muita pena de mim

Muita em quê?

Aflijo-me pecados que não cometi

Rasga o céu de minha consciência

Durmo tento salvar-me no horizonte

Penetra-me o espírito do mundo

Minha lucidez me enfraquece

Retorna ao centro meu tormento

Queria apenas esquecer de mim

Por fim cicatrizar-me...

Inverno de 2004

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 15/08/2005
Código do texto: T42834