Espectro

Ele tossiu cuspindo o beijo da noite.

Fria madrugada se espelhando numa poça dágua.

Espectros dançavam na ponta do " bagulho ".

Um sorriso trincado pontuando seu êxtase.

Ali todos eram manos. Solidariedade.

Saiu de cena e deslizou pelo beco.

Esgueirou-se até a ponta da ladeira.

Luzes demarcavam a cidade lá embaixo.

As mãos tremiam, os olhos marejavam.

Fixou-se num ponto, distante, que só ele divisava.

Ficou por ali, silente, erecto, concentrado.

Quando a manhã chegou e a brisa soprou os seus cabelos,

ele murmurou uma prece.

Pediu a Deus que protegesse seus únicos tesouros:

Sua esposa que, antes de ir trabalhar, levaria a sua filha para

o colégio.

Depois, enxugou os olhos, endureceu a face, crispou os dedos

e foi cuidar da sua vida...