[Voa Comigo: O Duplo]
Ambos sabemos:
nada está acontecendo a mim, voyeur
cravado na impermanência da paisagem;
para o nosso bem, ou o nosso mal,
tudo acontece a ele!
Enquanto eu falo de morte,
irônico, o outro apenas me sorri,
e diz que eu sou um mentiroso:
temos asas para cursar o imaginário!
O outro ama da vastidão da noite,
é um sonhador incorrigível,
não tem idade nenhuma,
e sempre tenta escapar
da tela pintada pela habitualidade vida:
excita-se quando vive situações de risco!
Ele é sarcástico:
jamais se envergonha quando revela
que sente um prazer indesculpável
em ver os outros viverem seus pífios papéis:
acredita que o Acaso e o Ridículo
andam sempre de mãos dadas!
Não tenho certeza se o duplo de mim
toma conhecimento de meus medos,
mas eu penso que sei como ele enfrenta os seus...
Não sei se vigio eu a ele, ou se ele vigia a mim:
ele sabe fruir a gostosa inutilidade da vida!
Afinal: para sermos honestos, ambos
temos de ser menos queixosos da existência,
até ontem, nunca morremos de nossa ambiguidade!
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[Desterro, 09 de abril de 2013]