A FOTO DA GAVETA

havia uma foto antiga na gaveta.

Por mais que jurasse de nada saber,

ela chorava o mais calado dos cantos tristes

— ao meu lado —

como se quisesse desmanchar, com seu chover,

o contorno da imagem à mostra, ali, cheia de espanto...

havia uma foto antiga na gaveta usada.

Eu, desconhecedor de todas as lembranças,

— novas ou antigas —

entre seus braços fui morrendo de passado

e nascendo a cada instante de silêncio

ouvi, sem surpresa, seu choro:

— Rasga?...

havia uma foto antiga na gaveta emperrada,

tão escondidinha que parecia até ter sido guardada...

havia uma foto na gaveta,

— só mesmo a foto —

pois a essência da alma que vivo

está ao meu lado fingindo-se de morta

silenciosa e quase triste

por ter me achado numa imagem do passado.

Havia uma foto na gaveta,

só uma foto:

— Coisa boba, não é?

Havia. Não há mais!