Gargalo

É tempo da vida

ser tomada no gargalo.

As taças que já existiram

foram se perdendo

em porres e sarjetas

e os poemas já não

brotam das gavetas.

Aonde eu fiquei?

Que rua eu não atravessei?

Quem é esse que recobre no espelho

a alma que um dia eu fui.

Donde veio esse rosto embaçado

de quem não quer ser notado?

As "Causas" já não são incisivas

e nem as "Massas" são pobres cativas

que alguma Revolução manteria vivas.

Em qual dentada

eu cuspi a derradeira ironia?

E quando foi o último coquetel

contra a "Mais Valia"?

Agora só há

essa dor que me alucina.

Essa tristeza que me cobre

como fria neblina,

essa angústia que me isola

como Muralha da China

e essa vontade

de que não haja

a próxima esquina.