Poema de Outono
                                               ®Lílian Maial
 
 

Eu vi um verso vadio vagando na várzea.
Um verso de mais de metro, soltando rimas ao vento.
Fazia frio e o poema era de outono.
Tinha um pôr do sol nas bordas das dúvidas,
um ocaso trêmulo de expectativas.
Às vezes, uma gaivota interrogava o entardecer.
Vinha um bando de folhas atapetar o caminho da noite,
rastro da lua, milagre de ouro em prata.
 
Eu vi um poeta pisar na poça.
Parir quartetos inquietos e tercetos insones.
Era tarde e a madrugada suava de nervosa.
Vez por outra, um bêbado tropeçava numa letra vagabunda,
pé quebrado atrapalhando a poesia,
e seguia o bardo sem teto e sem mantra,
fazendo que não via a mula sem cabeça.
 
Eu vi um sol nascer branquinho,
cheirando a pão com manteiga,
chamando o verso vadio para o dia.
Ainda havia neblina nas palavras
e o poeta sentou-se à mesa,
entre hífens e vírgulas,
se empanturrando de café com sonho.
Lá adiante, na linha do horizonte,
uma andorinha alinhavava uma chave de ouro.
 

*************