POEMA

POEMA

O poema que eu ainda não escrevi.

Está escrito nas nossas consciências!

Fala dos amores não correspondidos.

Fala dos sentimentos que amarfanham a alma.

Dos prantos carpidos em silêncio, sentidos em solidão.

Fala dos versos arremetidos das senzalas...

Fala da subjugação do homem pelo homem,

Fala dessa triste e abjeta realidade.

Fala de abandono, da sede e do frio!

E quer ser o perfume na rota dos desvalidos!

A falar das fomes, do isolamento por se sentir e estar sozinho,

E por não ter tido a dádiva do peito materno.

A poesia que eu não escrevi,

É escrita todos os dias nas sinaleiras...

Meninos e meninas sem bússola!

Fala dos preconceitos escancarados, camuflados!

Fala dos ressentimentos e dos temores,

Fala das dores que maceram rudemente na alma,

E que são entalhadas na indiferença e no descaso.

Festeja a mãe e a mulher, na sua plenitude.

Fala das longas noites de seres debaixo das marquises, e dos seus transes...

Fala da troca de sexo pelo pão que mitiga a fome.

A poesia que eu não escrevi, está grafada no peito.

Insurgidas cicatrizes a querer irromper sem ressalvas!

Perpassa pelas trajetórias execráveis do aborto.

Fala do desamparo de seres idosos!

Quer ser a caridade que acolhe o ser humano.

Visita o submundo dos guetos, dos becos e das favelas...

Fala da vergonha na alma de quem vê uma criança com fome!

A poesia que eu não escrevi são verdades prementes sem metáforas,

Pretende ser um canto de alerta pedindo socorro!

O poema que não escrevi, é uma ilha em mim mesmo.

Albérico Silva